Já estavam por
aquelas bandas em que o coração só dorme com um beijo-sussurro. Não passava um
só dia em que a voz um do outro não virasse alegria, fosse escrita ou vinda dum
sorriso face a face, fosse em tom mecânico, nenenzinho. Ela jamais imaginaria
que aquele abestado que quase vira morrer na contramão atrapalhando o trânsito, fosse lhe esquentar o
sangue.
E por mais que não se vissem tanto e tanto assim, conversar
por aquela janelinha, matava uma saudade enjoada que chutava o cotidiano de
casais felizes. Casal. Afinal, eram quase isso. Ela sentia, mas pensava mais e
sempre. Ele, era pra ela continuamente incógnita. Lúcido, patético, lindo,
sexualmente irresistível, com aquele jeito homem-menino e a criatividade toda.
Em tudo, tudinho. Ele chamava seu nome seguidamente e o sinal a aborrecia, vez
ou outra, mas na grande parte do tempo, ansiava por tê-lo. Mãos, beijo,
pensamento.
Ficava naquela de expressar-se imagética, discursiva, 2.0. E
lá se ia. Postava fotinhas bregas com frases mais bregas ainda. Tendo em vista,
que brega é amar pouco, escrevia, e se inscrevia nos caracteres
compartilhados. Havia chegado naquele
ponto em que não mais era um ficazinho conhecido de muros sombrios. Era sentimento
que se atirava dos beijos. Os meses já passavam dos dedos de uma mão. Foi
quando ele segurou-se, como nunca antes, nas mãos dela e disse quase não disse, numa volta dessas de dias normais.
- Flor, fica comigo?
- Eu já tô contigo, cara. Olhaqui, nós dois juntinhos.
E sorriu. Ele frizou-se.
- Eu tô falando sério. A gente pode mudar o status de
relacionamento e tal.
- Hum?
- Tipo pra relacionamento aberto ou sei lá...
- Relacionamento aberto?
- Não quer? Podemos colocar relacionamento sério mesmo.
Aquele Facebook tem tão poucas opções.
- Então tu quer colocar relacionamento sério porque tem
poucas opções? Não é um bom começo...
- Não! Eu não disse... quer dizer... eu não quis dizer isso.
Flor...
- Diga...
- Seria tipo um namoro...
- Tipo um namoro?
- É, daí só ia faltar eu conhecer tua mãe e teu pai e...
- Opa, xuxu. Vamos com calma. Pera. Xeu ver se eu entendi:
você quer mudar o status do relacionamento, namorar comigo e conhecer meus
pais?
- Não necessariamente nessa ordem...
- Hum? Calma, calma... Não sei, eu mal te conheço.
- Mal me conhece? Tá, esquece.
- Sim, mal te conheço, mas só sei que tem um bichinho que
fica mordendo uma veia minha bem aqui, só pode.
- Um bichinho?
- É. Às vezes faz cócegas, outras aperta e tal.
E ele tentou disfarçar um sorriso que seria belo, não fosse
a luz amarelada e morna do lugar. Postes. Um silêncio foi endeusado. Foram
segundos de muitos frames emperrados. Ele deu uma voadora no silêncio e
despontou.
- Amor, se você não quer...
- Não te conheci tão vestido assim de insegurança.
- Inseguro, eu? Só te fiz uma proposta. Foi você quem acabou
de dizer que tá apaixonada aê, cheia de bichinhos do amor.
- Ai, ai...
- O que foi?
- Nada.
- Diz, diz...
E ele realmente achou que um sorriso gigantesco esconderia a
aflição que sentia.
- Deixa, gatinho.
- Não. Diz, diz...
- Amor, chegamos. Vou indo, até amanhã. Beijo.
Antes que ele pudesse falar qualquer coisa, aquela boca que
ele sentia/imaginava de hora em hora fechou a sua. Foi pra casa, pensando,
pensando. Resolveu abrir a página-vício de cada dia. Uma notificação se
distinguia das outras e figurava. *Flor de Sah solicitou relacionamento sério
com você*. Antes que se arrependesse, tacou a setinha nervosa naquele botão
*aceitar*. Brilhou. Levou seis minutos inteiros para dormir, sorrindo.