domingo, 22 de abril de 2012

Eu, mulher...



Textinho que fiz para a Mística do Painel de Combate ás Opressões do Enecom Ma 2012

Eu sou mulher e não me vejo na mídia. Não me vejo real. Com meu cabelo alto, com meu nariz grande, com meus traços históricos. Não me vejo negra, nem gorda, nem flácida. Não me vejo. Dizem por aí que tenho liberdade... Que o machismo acabou... Mentira! Será que eu me visto como quero? Será que eu faço o que penso? E se faço, se me visto, não mexem, não falam, não me rotulam?

Na TV, no outdoor, no facebook, no rádio... Eu não sou a bunda passeando pela feira! Não. Sou ser pensante, andante, mulher. O meu corpo é meu e não é mercadoria. Eu, mulher, nem santa, nem puta, vou abrir meu bico. E você?

Quando o outro muda...

Quando o ser, historicamente frio, recebe indiferença, algo em seu eu se questiona. É como, talvez diria, ver um impossível materializado, tipo esperança em pedra, ET passeando na rua, histórias pintadas nos muros. É assim tão estranhamento que o vislumbre enxerta no rosto uma expressão dolente, indecisa. Posto que o assombro se acalma, o ego se embrulha, segurança, a vida se enche de dúvidas, e a base do sabido balança nos pés. Eis que é preciso o afago, antes não desperdiçado, para ver o outro reagir. Aquele ser que era o carinho, afeto, gélido agora, nem assim se faz desperto. Ah, sofrimento se instaura, balada de fundo de bar. Sim, é a hora de estar, declamar-se, expor, trinta juras na boca. O verso tolhido se amplia, a garganta é só enrouquecimento. Nem gagueira, nem orgulho tropeçam e a verdade escondida é desnudada, sentimento se rasga, paixão, cansaço puro. Vem o olhar precioso, sem brilho, carente, dizendo um não. Tristeza...

Fonte: http://terriblycute.com/friendly-cat-wants-stoic-dogs-attention/


















Fonte da imagem: http://terriblycute.com/friendly-cat-wants-stoic-dogs-attention/ 

quarta-feira, 18 de abril de 2012

[Amor em tempo de redes sociais] Capítulo 4 – O status



 

Já estavam por aquelas bandas em que o coração só dorme com um beijo-sussurro. Não passava um só dia em que a voz um do outro não virasse alegria, fosse escrita ou vinda dum sorriso face a face, fosse em tom mecânico, nenenzinho. Ela jamais imaginaria que aquele abestado que quase vira morrer na contramão  atrapalhando o trânsito, fosse lhe esquentar o sangue.

E por mais que não se vissem tanto e tanto assim, conversar por aquela janelinha, matava uma saudade enjoada que chutava o cotidiano de casais felizes. Casal. Afinal, eram quase isso. Ela sentia, mas pensava mais e sempre. Ele, era pra ela continuamente incógnita. Lúcido, patético, lindo, sexualmente irresistível, com aquele jeito homem-menino e a criatividade toda. Em tudo, tudinho. Ele chamava seu nome seguidamente e o sinal a aborrecia, vez ou outra, mas na grande parte do tempo, ansiava por tê-lo. Mãos, beijo, pensamento.

Ficava naquela de expressar-se imagética, discursiva, 2.0. E lá se ia. Postava fotinhas bregas com frases mais bregas ainda. Tendo em vista, que brega é amar pouco, escrevia, e se inscrevia nos caracteres compartilhados.  Havia chegado naquele ponto em que não mais era um ficazinho conhecido de muros sombrios. Era sentimento que se atirava dos beijos. Os meses já passavam dos dedos de uma mão. Foi quando ele segurou-se, como nunca antes, nas mãos dela e disse quase não disse, numa volta dessas de dias normais.

- Flor, fica comigo?
- Eu já tô contigo, cara. Olhaqui, nós dois juntinhos.

E sorriu. Ele frizou-se.

- Eu tô falando sério. A gente pode mudar o status de relacionamento e tal.
- Hum?
- Tipo pra relacionamento aberto ou sei lá...
- Relacionamento aberto?
- Não quer? Podemos colocar relacionamento sério mesmo. Aquele Facebook tem tão poucas opções.
- Então tu quer colocar relacionamento sério porque tem poucas opções? Não é um bom começo...
- Não! Eu não disse... quer dizer... eu não quis dizer isso. Flor...
- Diga...
- Seria tipo um namoro...
- Tipo um namoro?
- É, daí só ia faltar eu conhecer tua mãe e teu pai e...
- Opa, xuxu. Vamos com calma. Pera. Xeu ver se eu entendi: você quer mudar o status do relacionamento, namorar comigo e conhecer meus pais?
- Não necessariamente nessa ordem...
- Hum? Calma, calma... Não sei, eu mal te conheço.
- Mal me conhece? Tá, esquece.
- Sim, mal te conheço, mas só sei que tem um bichinho que fica mordendo uma veia minha bem aqui, só pode.
- Um bichinho?
- É. Às vezes faz cócegas, outras aperta e tal.

E ele tentou disfarçar um sorriso que seria belo, não fosse a luz amarelada e morna do lugar. Postes. Um silêncio foi endeusado. Foram segundos de muitos frames emperrados. Ele deu uma voadora no silêncio e despontou.

- Amor, se você não quer...
- Não te conheci tão vestido assim de insegurança.
- Inseguro, eu? Só te fiz uma proposta. Foi você quem acabou de dizer que tá apaixonada aê, cheia de bichinhos do amor.
- Ai, ai...
- O que foi?
- Nada.
- Diz, diz...

E ele realmente achou que um sorriso gigantesco esconderia a aflição que sentia.

- Deixa, gatinho.
- Não. Diz, diz...
- Amor, chegamos. Vou indo, até amanhã. Beijo.

Antes que ele pudesse falar qualquer coisa, aquela boca que ele sentia/imaginava de hora em hora fechou a sua. Foi pra casa, pensando, pensando. Resolveu abrir a página-vício de cada dia. Uma notificação se distinguia das outras e figurava. *Flor de Sah solicitou relacionamento sério com você*. Antes que se arrependesse, tacou a setinha nervosa naquele botão *aceitar*. Brilhou. Levou seis minutos inteiros para dormir, sorrindo.