sábado, 15 de outubro de 2011

Origens do flutu-ando...


Tem desses inconscientes empoeiradas que só modelam de coisas bobas mais relevantes do presente? Tinha disso nas crenças da moça. Ela sorriu e lembrou do causo. Pois que num dia desses de desânimo total resolveu desligar a playlist que ressoava Baden Powell e varou a noite de rua em rua.

Diriam que era louca, por sair em subúrbio tão coloquialmente aterrorizado e aterrorizante. Fazia já duas horas que alguns relógios gritaram meia noite. Mas o ar era tão frio e penetrante que ela até esqueceu tempo, efemeridades.

Feito besta, andou e ouviu tambores na mente. Esticou os braços e a preguiça lhe deu uns tapinhas de leve. Teve vontade de assistir desenho animado. Teve vontade de abraçar um gatinho que passava. Teve vontade de escorregar naquela calçada, topar e cair levemente, como se flutuasse. Varou uma esquina correndo, escorregou e caiu. Deitou, confortavelmente, numa queda em folhas secas tão macias como braços. Suspirou profundo e as folhas eram penas que lhe acariciavam. Nunca se sentiu tão confortável em toda a sua vida como naquele instante.

Sem perceber, já estava de pé. Em outra rua, ainda buscava a noite. Pé-ante-pé, ilustrava o escuro com seus sorrisos. Era alegria de vida que explodia dela. Deu por si e já estava correndo embaixo de árvores que lhe davam sombra na noite escura. Correu e caiu uma queda sem dor. Caiu e sentiu o aconchego do tufo de folhas que a embalava no colo. Do fundo dos olhos fechados, o escuro era mais escuro. O corpo ia e vinha sem sair do lugar. Lembrou de alguma coisa que não tinha a mínima importância e dormiu aquele sono acordado. Caia, caia, caia. E quanto mais caia, menos sentia-se.

Era impossível saber onde começou ou acabou. Mas o despertar, que ninguém sabe de onde vem, abriu seus olhos e ela nunca soube o que tinha sonhado naquela noite. Até que outra noite veio e essas mesmas quedas a repousaram. Sonhos-repetição. Lembrados e esquecidos. Antes que a vida os apagasse, ela resolveu escrevê-los. Freud não explicaria.

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