sábado, 18 de dezembro de 2010

PARTE I - Batida. Tropicão, de limão, cardíaca


E era como se visse seus pedaços no chão, depois de explodir de alegria. Estava ali, arreganhando um sorriso. Dentes alvos, lábios médios, aurora, amanhecer de felicidade. Lascou um punhado de blush, embora não precisasse, posta que estava naquele estado bêbado. Não, não tinha comprado doces, redbulls, ou mais drogas legais, divertidas, voadoras. O azul-lágrima nas unhas era revoltantemente tentador.

Afinal achara mais uma vez o amor da sua vida. Tudo nele era perfeitamente estimulador. Era uma fruta, um cera, um imã. Boa pegada, conversa de gente das letras, barbinha por fazer – maquinalmente preservada a cada semana -, estilo esporádico, um dia pra cada Chico. Soltadas poéticas, coxas grossas. Panturrilhas. “Meldeus!”, dissera pra confidente que perguntou sobre esse ponto, achado por ela primordial. Masculino. Fato. Estudava nas madrugadas, quando não estavam se amando. Amavam-se nas madrugadas, quando não estavam estudando. Sexo sem nexo. Cabelos jogados. Propositadamente despenteados. Um charme. E aquela unha bem cuidadinha, metrossexual de plástico. Ulálá. Aprovadíssimo.

E tropeçou na rua, desastrada que era. E a pedra no caminho vassourou aqueles pensamentos. Fez-lhe sentir dor. Era muito prazer pra que ela pudesse deter-se naquela topada. Seguiu, sem ver o sangue que a desconcertaria mais a frente. O moço da calçada veio em sua direção. Moça, seu dedão tá sangrando. Não era hemofílica, era dormente mesmo. Estava dopada da noite passada. Oi?.. Seu pé! Valha. Soltou, embora não estivesse ligando muito praquilo. Deixa eu fazer um curativozinho. Não, precisa não. Moça, tô quase me formando, ninguém me dá estágio, e você se recusa a que eu faça um simples curativo em você. Ave, depois disso, não podia recusar. Tá com pressa? Não, tô não, mas... Nem deu tempo, ele puxou levemente o braço dela pro banco na parada de ônibus a três metros. Tirou da maletinha, o esparadrapo e se jogou no labor. Diabéisso, assistência médica express, no meio da rua, sem a gente pedir. Pensou.

E a louca começou a rir. Não, não passa mertiolate não. Vai manchar minha sandália. Psiu! Eu sei o que tô fazendo beibe. E pluft. Ai, tá ardendo. Menina como você reclama. E ele segurou seu pé tão sutilmente, que ela se sentiu acolhida. Reparou na cena em que estava imersa. A louca começou a rir. Do que você está rindo? E os olhos verdes foram de encontro ao dela. Oi? E ele entendeu. Pronto. Que loucura né? Nem me toquei da topada. Vai saber... Agora tá melhor. Você estuda aqui? Não, na faculdade do lado. Ahhh. E faz o quê? Moço meu ônibus tá vindo. Desculpa. E... Ai... Brigadão viu? Até... Brigaaada... E escorregou pra dentro do ônibus que parecia querer vomitá-la de tão satisfeito de gentes que já estava.

Doida. Valha, ela esqueceu o livro e a agenda. Flor. Égua, nome estranho... não, bonito. É. A mãe dela devia ser hippie ou alguma coisa assim. Tipo vegetariana. Bem bonitinha. É. Louquinha, mas bonita. Ei, tem um telefone aqui. Pera, são... hum, ela deve estar vindo da aula. Deve pegar ônibus sempre nesse horário. E pegou aquele ônibus. Amanhã... E saiu cantarolando, altistando numa bateria imaginária. Nossa! e aquele pezinho... Amanhã.

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