sábado, 30 de outubro de 2010

PARTE I - Foi


Concentrou-se na janelinha que piscava. Berrava. Lá vinha ele outra vez. O pequeno círculo verde não era sinônimo de outras disponibilidades. Responder monosilábicamente sempre funcionava. Tentou. Nada. Tenho de ir agora. Digitou abreviadamente. Dois pontos, asterisco. Será que ele merecia? Titubeou. Levou em conta a banalização de tais expressões afetivas pontualísticas e afundou o indicador no <>. Arrematou com um tchau. Oh, como odiava os emoticons automáticos. Enfim.


Rumou com aquela extensão de seu braço à opção sair. Subitamente mais uma janelinha azul céu triste ascendeu. Sentiu mais vibrações tremerem suas carnes do que quando soube da possibilidade de se mudar pra longe. Quase viajou mesmo naquela hora, porém sem sequer levantar um dedo. Esperaria. A ansiedade não podia transforma-lhe num desses exemplares <<teens>> de aflição disfarçada de atitude. O pior aconteceu. Pelo menos foi o que avaliou na hora.


Viu vagarosamente – feito filme brega em slow-motion – crescer o retângulo fulgurante. No centro dele, um cheguei boa noite. Demorou um pouquinho. E foi lá procurar as letras de uma resposta descomprometida, inocentinha. Boa, soltou. Como a senhorita está? já pousou os olhos sobre o céu pretão que tem um buraco lindo e branco que reluz?. Ele pegara pesado. Pensou, e no pensamento mesmo, deixou escapulir um desembuchado palavrão de cinco letras. Não poderia ignorar. Foi lá e meteu na caixinha um puro e simples não. E prosseguiu. É foda como nesses nossos tempos a gente fica sabendo dessas coisas belas, naturais, dessa forma. Pronto, calculou. Pois devia preencher esses seus olhinhos lindos com aquela bolinha redonda, gostosa de se ver. Por que ele era assim hein? Tá, vamos lá, e preparou os dedos ágeis. Pois é, pouco tempo, vida cheia, trabalho até a noite. E quando a gente sai, só dá tempo de ver o fulgor do letreiro do ônibus. O jeito é acenar e rezar prele parar. Foi o máximo que conseguiu.


Então esse tumulto diário precisa de descanso beibe. Posso te relaxar com minhas metáforas bestas hoje à noite? Tudo bem, era tudo que ela queria, todavia aceitar assim de primeira... Nãaao. Ok, ok, pendeu o que seria em outra oportunidade um cotoco sobre o <> e o dedo mínimo sobre o <>. E ficou brincando num balanço automático. Casou essas letras em oito pares, achou digno e confirmou. Haveria tempo pra pensar. Ai, como odiava essa instantaneidade aparentada. É, tudo isso me deixa cansada. Arrependeu-se. Além das metáforas, posso lhe oferecer metonímias, massagens, ironias, e um jantar comprado que vou fingir que fui eu que fiz. Que tal? Era realmente irrecusável. Tenho que ver, ponderou. Só te lembro que eu não tenho diabetes, e a sobremesa é por sua conta. Vai trazer o quê? Tá bom xuxu, você me venceu pelo cansaço. Pelo cansaço mesmo. Te busco às 21h na sua casa docinho. E veio logo aquele está <>. Manipulador como sempre.


O relógio caminhava rapidamente e só lhe presenteou com indignos 83 minutos. Que horror. Resignou-se ao banho curtíssimo de 25 minutos. Unhas, maquiagem, cabelo, sapatos, ok. A roupa era pra manhã. Perfeito. Um vestidinho oriental. Tinha que latinizá-lo. Deu acessórios rubros. Estava pronta. Tinha ainda 12 minutos. Abriu o celular pra confirmar a hora. Nem deu tempo. O número jazia lá. E a música que reservara pra ele papocou sonoramente. Jantou sua ansiedade e deixou tocar mais um pouco. Quando a música e a forte vontade de roer a unha que acabara de pintar lhe consumiam fortemente, aceitou a chamada. Ensaiou um hey boy , já tô indo. E foi.

Nenhum comentário: